A Corregedoria Nacional de Justiça editou o Provimento 151/2023 que altera o Código Nacional de Normas, estabelecendo regras para o registro de natimortos em cartórios. O documento também determina os procedimentos para registro de nascimento de criança ou adolescente no caso de omissão.
O texto destaca que “é direito dos pais atribuir, se quiserem, nome ao natimorto, devendo o registro ser realizado no Livro ‘C-Auxiliar’, com índice elaborado a partir dos nomes dos pais”.
O provimento prevê também a dispensa da inclusão do indivíduo no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF e assegura o direito à averbação do nome no caso de registro de natimorto anteriormente lavrado sem essa informação, ou seja, tem efeito retroativo.
No caso de o bebê, embora tenha nascido vivo, morrer por ocasião do parto, serão feitos, necessariamente no mesmo cartório, dois registros: o de nascimento e o de óbito.
Já o registro de nascimento de criança e adolescente no caso de omissão, de acordo com o Provimento 151, passa a depender da expedição, por juiz de Vara da Infância e da Juventude, de mandado para o registro como forma de assegurar a proteção integral por meio da garantia do direito do indivíduo à personalidade.
Antes de realizar o procedimento, o magistrado deverá fazer consulta à Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC.
Direito à identidade
Consta no Provimento que, quando não for possível precisar a qualificação pessoal da criança ou do adolescente, a lavratura do registro dependerá de termo circunstanciado que informe hora, dia, mês, ano e lugar de nascimento; idade aparente; sinais característicos; e objetos encontrados com a criança ou o adolescente.
A nova norma prevê ainda que o processo de registro, no caso da impossibilidade de identificação do nome atribuído pelos genitores e quando couber, seja precedido de provas e diligências para identificar dados qualitativos da pessoa. O objetivo é permitir a vinculação a eventual história de vida e o respeito ao direito à identidade.
O Provimento 151 do CNJ destaca a necessidade de checagem em bancos de dados, inclusive genéticos, para verificação da possibilidade de se tratar de um desaparecido. Por fim, estabelece que a criança ou o adolescente com capacidade para se comunicar, verbalmente ou por outro meio, deverá ser ouvido sobre com qual nome se identifica.
Dignidade da pessoa humana
A registradora civil Márcia Fidelis Lima, presidente da Comissão Nacional de Notários e Registradores do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, avalia positivamente as novas regras impostas pela Corregedoria.
“Em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, as novas diretrizes se apresentam como mais uma ferramenta do registrador civil das pessoas naturais para exercer sua atividade primando pelo cuidado, pelo acolhimento e pela valorização da afetividade como norte nas relações familiares”, afirma.
Para ela, dar nome ao filho que não nasceu pode ser importante para uma família que criou expectativas com a chegada do novo membro.
“Ter um registro que constate a existência do filho, mesmo que limitada à vida intrauterina, identificando-o pelo nome que lhe fora escolhido, pode representar o fechamento de um ciclo para toda a família enlutada”, ela analisa.
No que tange às crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, Márcia Fidelis comenta que esses jovens, em geral abandonados pelos pais ou por eles negligenciados, quase sempre são residentes em abrigos públicos e muitos deles nunca foram registrados.
“Se, por um lado, esses pequenos cidadãos têm o direito inarredável de existir juridicamente, inserindo seu nome nos livros de registros públicos, por outro, é imprescindível que os dados que serão inseridos nesses registros espelhem, o mais possível, a realidade de cada um deles. É preciso diligenciar no sentido de descobrir circunstâncias que permitam estabelecer seu estado civil, assegurando-lhe que não seja vítima de burla à adoção e outras fraudes ou mesmo de tráfico de pessoas”, comenta.
Personalidade jurídica
A registradora civil ressalta que o objeto da primeira parte do Provimento é o natimorto, ou seja, o fruto da gestação que não nasceu com vida. Sendo assim, ele não adquire personalidade jurídica.
“O CPF pressupõe a existência de personalidade jurídica, perspectiva de exercício de cidadania, em qualquer de suas vertentes. O natimorto não adquire, formalmente, personalidade jurídica. Assim, inscrevê-lo na RFB e gerar um número de CPF, a mais de ser uma providência desnecessária, não é permitido”, afirma.
Já em relação à averbação de nome nos registros de natimortos lavrados anteriormente à edição deste ato normativo, ela afirma se tratar de uma “deferência aos pais que perderam seus filhos e, na época do registro, não lhe atribuíram um nome”.
“Como atributo da personalidade, ter um nome é um direito da pessoa, cuja existência pressupõe ter nascido com vida. O feto humano que tenha falecido antes do parto não adquire personalidade jurídica. Em tese, não poderia ser dado a ele um nome. Contudo, permitir aos pais nomear seu esperado filho, não é um direito que se garante ao ser despersonalizado mas, sim, aos pais, em respeito à afetividade que, inegavelmente, já os vincula ao filho”, pontua.
Tal procedimento era regulado em alguns Códigos de Normas locais, editados por alguns Tribunais de Justiça estaduais ou distritais. A partir de agora, passa a ser uma norma geral.
Fonte: Instituto Brasileiro de Direito de Família.
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