Uma mulher que buscava a alteração de seu registro civil para constar o nome indígena teve o pedido negado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ. Prevaleceu a divergência inaugurada pelo ministro Raul Araújo, de que o pedido não encontra amparo legal.
No caso dos autos, a mulher buscava alterar o nome e sobrenome para Opetahra Nhâmarúri Puri Coroado, nome indígena pelo qual se reconhece e é reconhecida pela comunidade. Ela alegou que iniciou aos 48 anos a aproximação com suas raízes indígenas na região em que seus pais nasceram.
Na época, a autora começou a participar de reuniões e manifestações indígenas. Posteriormente, mudou-se para a zona rural, fundou uma aldeia, passou a adotar tradições indígenas e tornou-se líder comunitária. O pedido foi rejeitado em primeira e segunda instâncias.
Princípio da imutabilidade
No STJ, a questão começou a ser analisada em junho de 2022. O relator, ministro Luís Felipe Salomão, votou favoravelmente por entender que o princípio da imutabilidade é mitigado quando prevalecer o interesse individual ou social da alteração.
O ministro pontuou que o nome civil constitui um símbolo da pessoa no meio social, bem como é um indicativo da ancestralidade do indivíduo. Além disso, ressaltou que apesar de o nome ser protegido pelo princípio da imutabilidade, a Corte tem flexibilizado esta regra em casos que não houver risco à segurança jurídica e à de terceiros. Naquela ocasião, o processo foi suspenso por pedido de vista do ministro Raul Araújo.
Em setembro de 2022, com a devolução da vista, Raul Araújo negou provimento ao recurso. O ministro considerou que o pedido não encontra amparo legal, pois a Lei de Registros Públicos (6.015/1973) não permite a exclusão total do nome, com a substituição por outros de livre escolha do interessado.
Segundo Raul Araújo, a Corte não tem precedentes autorizando uma mudança tão grande. Além disso, não ficou comprovada, de fato, a origem indígena.
“É incontroverso que a pessoa nasceu na cidade e foi criada como não indígena. Esse desejo de substituir totalmente seu nome não encontra amparo no ordenamento jurídico em vigor”, ponderou o ministro. Na sessão, o caso foi suspenso após pedido de vista do ministro Marco Buzzi.
Nessa terça-feira (21), o processo foi retomado com voto-vista do ministro Marco Buzzi. O ministro defendeu que o caso retorne à primeira instância para que, com a participação da Funai, seja analisada a possibilidade de mudar o nome da autora em razão de seu sentimento de pertencimento à tribo indígena.
Buzzi concluiu que o caso concreto demanda maior aprofundamento. “Jamais o sentimento de pertinência ou o direito de uma pessoa sentir-se, comportar-se e nutrir-se da cultura indígena há de ser negado. Contudo, o fato jurídico apto a gerar direitos por vezes colidentes com a segurança jurídica das relações sociais ou do interesse público envolvido depende de critérios materiais que precisam ser minimamente definidos e comprovados”, anotou o magistrado.
Ficaram vencidos os votos de Marco Buzzi e do relator. A divergência de Raul Araújo foi acompanhada por Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira.
Processo: REsp 1.927.090
Fonte: Instituto Brasileiro de Direito de Família.
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