A Justiça do Pará reconheceu a multiparentalidade em um caso emocionante envolvendo Nayara Bastos Cavalcante, uma odontóloga-periodontista de 30 anos. Nayara conseguiu oficializar na Justiça uma realidade que viveu desde o nascimento: a filiação socioafetiva com seus avós biológicos, Ubiratan e Elza, mesmo após a morte deles. A ação foi ajuizada em conjunto com os irmãos socioafetivos, que são seus tios biológicos.
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Nayara é filha biológica de Elzanara, que possui deficiência cognitiva e é interditada civilmente. Desde antes de seu nascimento, seus avós, Ubiratan e Elza, buscaram formas legais de adotá-la, sabendo que a filha não poderia cuidar dela. Na época, a única alternativa disponível era obter a guarda, o que eles fizeram na esperança de que fosse suficiente para que Nayara fosse reconhecida como filha deles aos olhos da lei.
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Nayara nasceu em 1993 e cresceu em um lar onde seus avós desempenharam o papel de pais. Ela descreve sua avó como uma mãe amorosa e cuidadosa e seu avô como um exemplo de caráter e honestidade. Sua mãe biológica, Elzanara, foi criada junto com ela, quase como uma irmã, devido à sua incapacidade.
Apesar de sempre saber que sua família não era convencional, Nayara recebeu todo o amor e cuidado de seus avós. Ao longo dos anos, ela se tornou a responsável pela casa, cuidando dos avós e da mãe biológica. A diferença de idade entre Nayara e seus avós era evidente, e ela assumiu responsabilidades de adulta ainda jovem.
Quando chegou a época de prestar vestibular, Nayara sentiu profundamente a ausência do reconhecimento legal de seus avós como pais. Ela não podia preencher formulários com os nomes de Ubiratan e Elza como seus pais, o que lhe causava grande desconforto. Apesar das dificuldades, Nayara cuidou de sua família com dedicação e amor.
Em 2016, Nayara enfrentou a perda de seus avós, que faleceram com um intervalo de apenas 14 dias. Apesar de ser o pilar da casa, a presença de seus avós lhe dava forças. Em 2022, incentivada por uma amiga e ouvindo um programa de rádio sobre reconhecimento de paternidade post mortem, Nayara decidiu procurar um profissional do Direito de Família para buscar o reconhecimento legal de sua história de vida.
A ação judicial destacou que Nayara sempre foi reconhecida pela família como filha de Ubiratan e Elza. Após uma audiência em fevereiro de 2024 e a manifestação favorável do Ministério Público em maio, a decisão judicial foi proferida em julho. Nayara finalmente conseguiu ver sua verdade reconhecida nos documentos oficiais, incluindo os nomes de seus avós como pais.
A decisão da 1ª Vara de Família de Belém reconheceu a multiparentalidade, mantendo o nome da mãe biológica de Nayara no registro, juntamente com os nomes dos pais socioafetivos. Esse reconhecimento trouxe felicidade e gratidão para Nayara, apesar da saudade de seus avós.
A advogada Jamille Saraty, que atuou no caso, explicou que a multiparentalidade é um fenômeno que reconhece pessoas criadas por mais de um pai e uma mãe. Ela destacou que a filiação socioafetiva está consolidada no Direito brasileiro, embora ainda haja falta de informação sobre esse direito.
No caso de Nayara, a incapacidade da mãe biológica foi determinante para o reconhecimento da filiação socioafetiva. A inclusão dos nomes dos avós como pais também garantiu a Nayara o direito de herdar deles, embora a partilha dos bens já tivesse sido realizada de forma consensual entre os herdeiros.
A advogada ressaltou que a falta de informação sobre os direitos e os procedimentos legais é um dos principais desafios enfrentados por famílias que buscam o reconhecimento da filiação socioafetiva. Ela enfatizou a importância de advogados bem informados para fundamentar corretamente os pedidos judiciais e a necessidade de regulamentação expressa desse tema no Código Civil.
Essa decisão representa um marco importante para o reconhecimento da multiparentalidade e da filiação socioafetiva no Brasil, trazendo justiça e legitimidade para histórias de vida como a de Nayara.
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